terça-feira, 25 de outubro de 2011

Clarice Lispector

O Milagre das Folhas

Não, nunca me acontecem milagres. Ouço falar, e às vezes isso me basta como esperança. Mas
também me revolta: por que não a mim? Por que são de ouvir falar? Pois já
cheguei a ouvir conversas assim, sobre milagres: “Avisou-me que, ao ser dita
determinada palavra, um objeto de estimação se quebraria.” Meus objetos se
quebram banalmente e pelas mãos das empregadas. Até que fui obrigada a chegar à
conclusão de que sou daqueles que rolam pedras durante séculos, e não daqueles
para os quais os seixos já vêm prontos, polidos e brancos. Bem que tenho visões
fugitivas antes de adormecer – seria milagre? Mas já me foi tranquilamente
explicado que isso até nome tem: cidetismo, capacidade de projetar no campo
alucinatório as imagens inconscientes.

Milagre, não. Mas as coincidências.

Vivo de coincidências, vivo de linhas que incidem uma na
outra e se cruzam e no cruzamento formam um leve e instantâneo ponto, tão leve
e instantâneo que mais é feito de pudor e segredo: mal eu falasse nele, já
estaria falando em nada.

Mas tenho um milagre, sim. O milagre das folhas. Estou andando pela rua e do vento me cai
uma folha exatamente nos cabelos. A incidência da linha de milhares de folhas
transformadas em uma única, e de milhões de pessoas a incidência de reduzí¬-las
a mim. Isso me acontece tantas vezes que passei a me considerar modestamente a
escolhida das folhas. Com gestos furtivos tiro a folha dos cabelos e guardo-a
na bolsa, como o mais diminuto diamante.

Até que um dia, abrindo a bolsa, encontro entre os
objetos a folha seca, engelhada, morta. Jogo-a fora: não me interessa fetiche
morto como lembrança. E também porque sei que novas folhas coincidirão comigo.

Um dia uma folha me bateu nos cílios. Achei Deus de uma grande delicadeza.
Clarice Lispector


erá que CLARICE não percebia?!

Divina é a poesia…

Dedico esta postagem às pessoas que possui o dom de escrever…

Às pessoas que, de tudo! tira poesia… Extrai, macera (esmagar uma substância sólida
para lhe extrair o suco), transforma, CRIA… SIM!

Dito isto ainda digo que nós amamos a Clarice, amamos a poesia…

EU AMO Gerson Wiech que transforma o breu; a dor; a vida; o pão… Em POESIA.

Aos “diminutos diamantes” de Clarice, que a convidavam a sentir a vida, e transformar o destino das folhas que caíam…

É O MILAGRE DA POESIA…

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